Não temos um plano B. Nem outro planeta
*Por Cindy Correa – “Não há plano B” foi uma expressão repetida diversas vezes por Paulo Artaxo, físico e membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC), em sua longa jornada de divulgação do novo relatório da entidade (AR-6). Essa foi a forma dele trazer esperança que a humanidade vai conseguir reverter o quadro apocalíptico que o estudo apresenta. Que ele não me escute, pois para ele, a mídia não ajuda ao trazer um cenário nesses tons catastróficos. Ele tem razão, porque não há espaço para pânico. É preciso reagir. Precisamos como humanidade agir e exigir ações urgentemente como nação e como planeta.
Feito por centenas de especialistas de todo o globo, o relatório mostra de forma cabal que a humanidade está mudando o clima. Sim é a emergência climática do antropoceno. O clima está mais quente e se tudo continuar como está vai piorar. Os efeitos monumentais disso são diversos. Estamos acelerando o aumento do nível do mar, que subiu 23 cm desde o início da revolução industrial, e agora vem numa crescente de 1,3 cm por ano durante a década de 70, saltando para 4 cm por ano atualmente.
Não entendeu ainda o risco monumental disso? Paulo Artaxo — que físico! –ilustrou em sua live no Valor Econômico, daqui uns 100 anos, seus netos talvez não tenham a oportunidade de ver as lindas praias como temos hoje.
Isto é, toda zona costeira vai se transformando em uma potencial área de crise, pois o aumento não é só um crescimento constante, tem as manifestações extremas, como ressacas que minam e destroem a infraestrutura.
A região do semiárido nordestino corre risco de ficar mais árido ainda, impactando fortemente uma região que é densamente populosa e já vive muitos desafios econômicos e sociais. O Brasil já viu na sua história o impacto de uma prolongada seca combinada com uma crise econômica, com a sofrida migração nordestina do século passado. E se você não estava por aqui, não lembra ou nunca escutou Carcará original com a Maria Bethânia, segue um trecho que mostra um pouco do drama. “”Em 1950 mais de dois milhões de nordestinos viviam fora dos seus estados natais. 10% da população do Ceará emigrou. 13% do Piauí! 15% da Bahia!! 17% de Alagoas!!!”
Sim, quem irá sofrer mais com a emergência climática são as populações vulneráveis. E já há até expressão, os refugiados climáticos.
Os avisos não são só para o futuro. Sentimos já os efeitos no bolso, com as altas de preços puxadas pela seca e geadas que já assolam o Brasil e as lavouras, causando prejuízos na produção de alimentos e cenários de estresse energético. Na estimativa da MB Associados o PIB brasileiro poderia ter um crescimento de 5,5% este ano, mas com esses eventos extremos do clima, o avanço deve ser menor, de 4,7%, representando uma queda de R$ 60 bilhões na economia do país. Produzir alimentos vai ficar mais dispendioso e difícil.
Portanto, temos que evitar emissões e reduzir o volume de gases de efeito estufa no ar. Para isso, não há nada igual à fotossíntese. E neste quesito, o Brasil tem aí um desafio e uma fortaleza. Devemos agir como nação e parar com o desmatamento ilegal. Não podemos ficar calados enquanto a criminalidade rouba e queima a floresta Amazônica, comprometendo o futuro. Nosso e dos filhos de vocês.
Esse desafio é um que já enfrentamos anteriormente e mostramos como nação que podemos ser maiores do que os interesses do garimpo ilegal, do que a grilagem e das queimadas ilegais.
Por outro lado, temos fortalezas, como um país que ainda tem muitas áreas preservadas e também pelo grande conhecimento que temos em agricultura verde, regenerativa, incluindo plantação de árvores para fins industriais.
O cultivo de árvores no Brasil é um case de sucesso. Temos em uma área de cerca de 1% do país uma agroindústria que é a segunda maior do mundo em volumes produzidos de celulose e a maior do mundo em exportação. Com técnicas de manejo modernas remove CO2 da atmosfera e estoca no solo, na própria árvore e futuramente em seus mais de 5 mil produtos e subprodutos. Por ano, esse segmento sequestra 4,48 bilhões de toneladas de CO2 equivalente. Isto representa mais do que toda a indústria nacional emite em um ano.
Este é um setor que planta mais de 1 milhão de árvores para fins industriais por dia, além de mais de 1 árvore nativa a cada 2 minutos para recuperação de áreas e cuidado com o meio ambiente.
Temos que atuar na esfera privada e na esfera pública. Como consumidores buscar opções mais sustentáveis, impulsionar a nova bioeconomia, trocando produtos que são feitos de petróleo por opções como dizem por aí, plant based, e de olho na economia circular, se preocupando para onde vai o seu pós-consumo e como melhorar toda essa cadeia. Mas o maior potencial está na construção de mecanismos globais, já que o carbono emitido por milionários testando suas naves intergalácticas me afeta em São Paulo.
*Cindy Correa é jornalista, estudante de química, está no comando da Comunicação da Ibá (Indústria Brasileira de Árvores) e quer começar um negócio de cosméticos verdes. Entre em contato com a autora: https://www.linkedin.com/in/cindy-correa-895568b/ e Cindy.correa@iba.org
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Referências:
Relatório do IPCC: https://www.ipcc.ch/report/ar6/wg1/
Live – Paulo Artaxo: https://valor.globo.com/live/noticia/2021/08/11/live-do-valor-o-fisico-paulo-artaxo-fala-sobre-a-crise-climatica-a-economia-e-o-impacto-social-nesta-sexta-as-11h.ghtml
Vídeo – Maria Bethania (1965):